Entenda o que muda no cérebro depois de um AVC
Existem dois tipos de acidente vascular cerebral (AVC): o isquêmico, quando a obstrução em uma artéria não deixa o sangue passar, ou o hemorrágico, quando o vaso sanguíneo se rompe, espalhando sangue no cérebro. Em qualquer um dos casos, a intervenção rápida – seja desobstruindo a artéria, removendo o sangue com cateter ou cirurgia – é essencial para minimizar as sequelas e facilitar a reabilitação.
Uma das queixas mais frequentes no consultório são as sequelas causadas pelo AVC, principalmente aquelas mais ligadas ao comportamento. É importante que pacientes e familiares saibam que elas são normais e fazem parte de uma nova realidade – sob alguns aspectos, pode ser temporária, sob outros, permanente, e será necessário se adaptar. É preciso paciência e atendimento especializado, na maioria das vezes multidisciplinar, para que tudo volte ao normal ou o mais perto do normal possível. Também é essencial mudar alguns hábitos para que o AVC não volte a se repetir.
Afasia, disartria e apraxia, o que são?
Um dos problemas que surgem é a afasia, que é a dificuldade de comunicação. A pessoa pode esquecer de como se fala. Existem vários tipos:
– O paciente que sabe o que quer falar, mas tem dificuldade por não conseguirem encontrar as palavras certas ou têm problemas para entender o que é dito. Eles também podem confundir palavras.
– Aqueles que têm dificuldade em entender o que é dito, não compreendem a ordem delas ou que relação têm entre si.
– E há os indivíduos que se tornam incapazes de falar nomes, objetos, repetir frases ou seguir comandos e podem demorar a entender o que é dito.
Outra possível sequela é a disartria, quando a pessoa perde o controle dos músculos do rosto, língua e boca. Esses pacientes podem saber o que dizer, mas falam devagar, de forma arrastada, abafada, rouca ou nasalizada.
Há também a apraxia: a pessoa têm dificuldade em fazer com que aquilo que está pensando chegue à boca. Esse problema pode afetar leitura e escrita.
Eu sempre digo a meus pacientes e os familiares deles que é preciso ter paciência. A pessoa não perdeu intelecto, ela continua com a mesma inteligência de sempre, mas o AVC afetou sua possibilidade de se comunicar. Sei que é difícil, mas não dá para culpar o paciente, não é mesmo? Ele está tendo uma enorme dificuldade de se adaptar à nova condição, conciliar reabilitação e precisa de todo o carinho e acolhimento possível.
Mudanças emocionais
Elas também são muito comuns e muitas vezes estão associadas com as outras mudanças. Se é o cérebro que controla nossas emoções, nada mais natural do que uma ocorrência tão séria nesse centro de comando coloque algumas coisas fora de lugar, não é mesmo? Após um derrame, o paciente pode se tornar triste, esquecido, descuidado, irritado ou confuso, além de ansiosos, com raiva e depressão. O comportamento vai depender de qual parte do cérebro foi afetada e a extensão da lesão.
Os sintomas podem começar logo nos primeiros passos da reabilitação. Assim como todos os outros sintomas decorrentes do AVC, esses devem ser tratados o quanto antes para que o paciente não precise ficar mais tempo em hospital ou até mesmo para que não regrida nas conquistas conquistadas ao longo da reabilitação.
Os sintomas de depressão podem ser diferentes, mas alguns são bem comuns. Os familiares devem ficar atentos se persistirem.
- Tristeza permanente, ansiedade, desespero ou sensação de vazio;
- Sentimentos de culpa, inutilidade, desamparo (como se fosse um fardo);
- Redução de energia, sensação de fadiga, como se a bateria estivesse acabando;
- Dificuldade de foco, problemas de memória, dificuldade de tomar decisões;
- Mudanças no apetite;
- Humor deprimido e perda de interesse e prazer em atividades que antes eram esperadas, como assistir a filmes e passear;
- Dormir demais ou dormir pouco;
- Diminuição da motivação;
- Respostas sem emoção;
- Pensamentos de morte ou suicídio.
Outros problemas comuns são a ansiedade causada pelas mudanças, inclusive financeiras que o AVC impõe. Também existe o afeto pseudobulbar (PBA), quando ficam feridas as partes do cérebro que controlam as emoções. Os pacientes podem passar a apresentar choro fácil, rir de forma incontrolável ou ter mudanças repentinas de humor.
Mais uma vez, a paciência é fundamental. Não adianta pedir para seu pai, avô, sogro parar de rir ou chorar. Quando a pessoa se acalmar, pergunte como ela quer ser tratada durante esses episódios – muitas vezes, elas preferem que a questão seja ignorada, como se fosse um soluço. Com o tempo o quadro deve melhorar, mas há tratamentos disponíveis se esse for um incômodo.
Problemas de memória
Quem sobrevive a um derrame pode ter problema de memória, para planejar, organizar ideias e tomar decisões. Às vezes, depois de um derrame, o paciente pode se lembrar apenas de um curto período de tempo. Por exemplo: se você pedir que ele se alimente, escove os dentes, tome banho, passeie no jardim, leia um livro, assista TV e depois vá descansar, pode ser que ele apenas se alimente e escove os dentes, pois se lembra apenas de parte das instruções. É normal que eles se esqueçam se tomaram remédio ou tomaram banho, por isso é sempre bom estar de olho – sem sufocar a pessoa, ok? Ela precisa se sentir cuidada, porém independente na medida do possível.
Quem teve um AVC também pode ter problema para absorver novas informações, por isso pode ser necessário repetir a mesma coisa várias vezes. A transição também pode exigir paciência: no hospital, a pessoa consegue ir da cadeira de rodas para a cama sem nenhum problema; em casa, ela pode ter de reaprender a mesma ação. Outro comportamento muito comum é confundir datas e pessoas: pode falar que uma sobrinha visitou ontem à noite quando na verdade quem foi visitá-lo foi uma amiga na semana anterior.
A reabilitação vai demandar algum tempo, mas é possível. Se a pessoa não conseguir se reabilitar plenamente, voltar totalmente à vida de antes, com certeza a reabilitação vai trazer mais qualidade para o dia a dia, possibilidade de voltar a trabalhar, a fazer as coisas de forma autônoma…A equipe pode ser multidisciplinar, conforme a necessidade do paciente: assistente social, enfermeiro, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico, nutricionista, psicólogo, terapeuta ocupacional.
Mesmo depois de um AVC, é importante continuar levando uma vida saudável para evitar um segundo episódio. As dicas também valem para quem nunca teve o problema:
– Alimente-se bem
– Reduza o consumo de sal
– Pratique atividade física
– Não fume e consuma álcool com muita moderação
– Evite a obesidade
– Relaxe (essa é essencial e muita gente esquece. Descansar não é só dormir oito horas por dia, é ter momentos com a família, assistir a um filme, ouvir música…)
Ah, e eu não poderia deixar de falar sobre os sintomas do derrame:
- Fraqueza e/ou paralisia de um lado do corpo
- Dificuldade para falar
- Perda de visão
- Perda de sensibilidade de um lado do corpo
- Alterações motoras
- Distúrbio de linguagem
- Distúrbio sensitivo
- Alteração no nível de consciência
Importante salientar que, ao apresentar qualquer desses sintomas, é preciso CORRER PARA O PRONTO-SOCORRO. Quanto antes começar o tratamento, a tendência é que haja menos sequelas e a reabilitação seja mais tranquila.
Qualquer dúvida ou necessidade, estou à disposição pelo telefone (19) 99312-4073.
Dr. Davi Klava
Atendimento médico em Neurologia Clínica